“O Estado brasileiro não pode abrir mão de patrimônios importantes como a Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e BNDES. O momento vivido pelo país é decisivo e cabe à população conhecer as propostas em disputa nestas eleições, no que diz respeito às empresas, aos serviços e ao sistema financeiro público. Quem perde com o desmonte dos bancos públicos não são apenas os trabalhadores dessas instituições, mas toda a sociedade”.
Foi assim, de maneira direta e incisiva, que o presidente da Fenae, Jair Pedro Ferreira, marcou sua participação no debate sobre “O futuro dos bancos públicos” realizado pela quarta edição da série Diálogos Capitais, na manhã desta terça-feira (16) no Rio de Janeiro, numa promoção da revista Carta Capital com o apoio da própria Fenae. O evento, mediado pela jornalista Cynara Menezes, foi aberto por vídeo encaminhado por Luiz Gonzaga Belluzzo (doutor em Desenvolvimento Econômico e professor-titular da Unicamp), para quem “o futuro dos bancos públicos e o futuro do Brasil estão interligados”.
Além de Jair Ferreira, os debatedores foram Emir Sader (sociólogo, doutor em Ciência Política e coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e Esther Dweck (doutora em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro). Na ocasião os temas em pauta foram os desafios dos bancos públicos diante do atual cenário político do país, dominado por situações de instabilidade econômica, fragilidade democrática e avanço da política de privatizações. As discussões foram acompanhadas ainda por representantes de entidades dos empregados da Caixa e de outras instituições financeiras federais, além de representantes do movimento associativo.
Defesa dos bancos públicos
Em seu pronunciamento na série Diálogos Capitais, o presidente da Fenae reafirmou posição em defesa da Caixa 100% pública e do papel fundamental que os bancos públicos têm para o desenvolvimento econômico e social do país. Ele criticou a concentração bancária estúpida em vigor na economia brasileira, com cinco grandes bancos dominando esse mercado, estando nesse seleto grupo dois públicos (Caixa e BB), e disse que o ajuste fiscal levado adiante pela equipe econômica do governo está sendo executado para tirar direitos dos mais pobres.
Jair Ferreira compartilhou com o público dos Diálogos Capitais o resultado da pesquisa recente do Vox Populi, na qual está revelado que a grande maioria da população brasileira é contra a privatização dos bancos estatais, “por mais que exista hoje uma campanha negativa sobre o serviço e o servidor público”. Essa pesquisa, segundo ele, mostrou também que “70% dos entrevistados é contra a privatização do sistema financeiro público”, ideia que continua na mira de economistas liberais ávidos por enxugar o Estado. E alertou: “Sem bancos públicos vai ser muito difícil, a sociedade brasileira vai pagar um preço muito alto. Notadamente o setor mais carente, que depende do Estado como principal indutor da distribuição do desenvolvimento. O certo é que, sem as empresas públicas, não diminuiremos a desigualdade no país”.
Para o representante dos empregados da Caixa, um bom exemplo da importância dos bancos públicos é a capacidade de alcançar locais e clientes nos quais as instituições privadas não possuem interesse. “No Amazonas, por exemplo, não há um financiamento habitacional feito por bancos privados, são todos via instituições federais. Se eu for no Ceará, são 95% dos financiamentos via crédito federal.”
Segundo ele, diante do avanço das privatizações, a recuperação do prestígio da esfera pública passa pelo desafio do debate contínuo para interromper o desmonte dos bancos públicos, “devendo estarem juntos nessa mobilização por um país e uma sociedade melhores todos os setores do nosso Brasil”.
Retomada do papel dos bancos federais
Depois de afirmar que o mundo não vai puxar a retomada, as empresas privadas não vão investir e que sobra apenas o Estado para reverter a situação de crise, a economista Esther Dweck classificou de voo de galinha o crescimento econômico do Brasil “se a atual política de ajuste fiscal e contenção de investimento estatal continuar nos próximos anos”.
Durante a sua apresentação, a pesquisadora da UFRJ exibiu dados para explicar que a recessão econômica do Brasil atual é grave, mas que o receituário para tirar o país da UTI não está ajudando, pelo contrário, podendo essa situação seguir sem alguma alteração a depender do resultado da próxima eleição. “O que está sendo proposto é justamente tirar o Estado do seu papel de estabilizador econômico. E isso tem muito a ver com a discussão sobre o papel dos bancos públicos no país”, alertou.
Para Esther Dweck, os bancos federais deveriam ter papel essencial no processo de recuperação da economia do Brasil, observando que o setor público, seja federal ou estadual, se financia particularmente com os bancos públicos. E completou: “Se você olhar o saneamento básico, o setor rural, o transporte, a habitação, essas áreas dependem de bancos estatais, como o Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. O que a gente está vendo é um grande desmonte dessas capacidades de financiamento. Tudo isso pode piorar, dependendo dos resultados das urnas no dia 28 de outubro”.
Bancos públicos alavancam políticas sociais
O sociólogo Emir Sader foi outro palestrante do painel “O futuro dos bancos públicos”, durante a série Diálogos Capitais. Ele começou seu relato indo direto ao ponto: “O destino dos bancos públicos está ligado ao destino do Brasil”. Em seguida explicou que um dos aspectos positivos dos governos Lula e Dilma (entre 2004 e 2014) foi alavancar as políticas sociais na perspectiva de redução das desigualdades, “diferentemente do que faz o atual governo do país, que não precisa de bancos públicos porque não tem função no marco do impulso ao desenvolvimento produtivo do país e da implementação sistemática de políticas sociais”.
Sader afirmou ainda que a defesa dos bancos públicos se identifica com a defesa do Brasil, dos interesses do país, do fortalecimento do Estado e das políticas sociais. Segundo ele, os bancos públicos surgiram e se fortaleceram no Brasil quando havia governos que assumiam responsabilidades no plano social, promoviam o crescimento produtivo do país e garantiam formas de distribuição de renda.
Para Emir Sader, ao longo da história, os bancos públicos tiveram funções fundamentais na política do Estado brasileiro, mas durante os mandatos dos governos petistas a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil assumiram papeias ainda mais relevantes, como o de alavancar as políticas sociais. “A Caixa se tornou o segundo maior banco do Brasil na esteira do financiamento habitacional do programa Minha Casa, Minha Vida”.
Nesse sentido, o sociólogo explicou que os bancos públicos são ferramentas fundamentais para que ocorra esse processo de democratização econômica e política. “O centro da questão da democracia é a polarização público versus interesses mercantis e isso tem relação direta com a polarização entre bancos púbicos e bancos privados”, concluiu.
A íntegra do debate sobre o futuro dos bancos públicos pode ser assistida no site https://www.cartacapital.com.br/dialogos-capitais.